segunda-feira, outubro 15, 2007

Povos da Floresta pedem mudança do modelo das grandes obras

Font: Brasil de Fato
http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/nacional/povos-da-floresta-pedem-mudanca-do-modelo-das-grandes-obrase

Povos da Floresta pedem mudança do modelo das grandes obras
por jpereira —
Última modificação 27/09/2007 16:27
Encontro em Brasília reafirma papel estratégico dos povos indígenas e populações tradicionais para a preservação do meio ambiente

27/09/2007

Gisele Barbieri

de Brasília (DF)

“Os povos indígenas e populações tradicionais retomam a Aliança dos Povos das Florestas e a luta para permanecer em suas regiões preservadas e em conservação da Amazônia, incluindo outros biomas (Cerrado, Caatinga, Pantanal. Mata Atlântica e demais regiões do país)”.

Este é o pedido que abre a Declaração dos Povos da Floresta em 2007, divulgada no II Encontro dos Povos da Floresta, encerrado no domingo (23), no Centro de Convenções Ulysses Guimarães em Brasília (DF). A Declaração foi elaborada e aprovada pelos cerca de cinco mil participantes do evento. Nela estão contidos quatro eixos que resumem as necessidades das 80 etnias indígenas, ribeirinhos, pescadores, quebradeiras de coco representadas no evento.

A Aliança dos Povos da Floresta – que reúne a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), o Conselho Nacional dos Seringueiros e o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) – foi idealizada por Chico Mendes na década de 80. Na época o ambientalista e sindicalista já fazia este alerta da necessidade de preservação dos seringais e das florestas desta região. Assassinado em 1989, Chico Mendes não chegou a participar da primeira edição deste evento, realizado no Estado do Acre.

Modelo das grandes obras

Um dos eixos contidos no documento reafirma o papel estratégico que estas populações desempenham na proteção das florestas. Se na primeira declaração, em 1989, eles buscavam o reconhecimento da população brasileira das potencialidades destes povos e de suas regiões, a realidade vivida por eles desde então pede hoje o fim do modelo implantado pelo governo, caracterizado por grandes obras de infra-estrutura, através de programas como de Aceleração do Crescimento (PAC).

O PAC prevê obras na região amazônica que causarão um grande impacto à vida de comunidades como os riberinhos. Entre estas obras estão as hidrelétricas de Belo Monte, no Pará e Santo Antônio e Jirau, em Rondônia. As obras enfrentam alguns impedimentos na fase de licenciamento ambiental, mas o governo só espera a resolução destes problemas para que elas sejam iniciadas.

“As obras de infra-estrutura ameaçam a integridade física dos nossos territórios e a perspectiva de desenvolvimento sustentável”, lembra o coordenador geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Jecinaldo Saterê-Mawê.

O governo entende este papel estratégico das comunidades, mas precisa avançar na identificação e solução de problemas como este. Ações como a criação de mais reservas extrativistas são os pontos positivos na visão das populações da floresta.

De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (MMA) eram 5 milhões de hectares no início do governo; até este ano, o número duplicou pra 10 milhões. “O esforço do governo existe, mas temos que reconhecer que tantos hectares de reservas extrativistas, sem crédito e regularização fundiária não auxiliam estas populações a usufruírem de suas riquezas”, diz Pedro Ivo de Souza Batista, Diretor do Departamento de Cidadania e Responsabilidade Socioambiental do MMA.

Para ele, a falta de infra-estrutura acaba esbarrando em outra realidade bem mais forte, citando o exemplo da transnacional fabricante de papel Aracruz Celulose que, em regiões da Bahia, impacta os manguezais com suas vastas plantações de Pinos.

Aquecimento global

A alternativa para contornar os efeitos do aquecimento global no Brasil, também pode estar nas mãos destes povos, segundo a declaração. São eles os responsáveis pelas atividades de desenvolvimento sustentável que amenizam os impactos da devastação das florestas.

Pedro Ivo alerta que a presença dos povos da floresta em Brasília traz a realidade de populações que vivem de atividades que não degradam o meio ambiente inserindo um novo processo de produção diferente do latifúndio. Segundo ele, é um Brasil muitas vezes invisível. “Isto obriga o governo a atender estas demandas. Mostram que é possível produzir gerar emprego e renda sem impactos”.

Outro problema enfatizado pelos povos da floresta é a dificuldade da posse da terra. As comunidades indígenas exemplificam a questão. Além da demora no processo de demarcação, os recursos destinados à homologação e reconhecimento de territórios sofreram uma redução de 27% entre os anos de 2003 e 2006, segundo o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Este é um aspecto importante, porém não é o único. “É preciso bem mais do que a posse da terra. A Declaração dos Povos da Floresta não pode ficar somente no papel, a partir de agora, que já mostramos nossa força, nosso desafio é cobrar um compromisso do governo com nossos povos. Precisamos de infra-estrutura, de energia sem degradação, de valorização das nossas vidas”, cobra Marcus Apurinã vice-coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).

Os povos das florestas reivindicam também a garantia de implantação do tema educação ambiental no ensino formal, médio e superior, além de políticas públicas de educação, saúde, justiça, assistência técnica e direito ao uso sustentável da terra, de forma adequada às especificidades de cada povo.

Até 15 de outubro será produzido um relatório final sobre o evento que será entregue ao presidente Lula. Os povos da floresta querem uma audiência com o presidente e todos os ministros para a entrega do documento que, segundo os organizadores, poderá nortear o governo na definição de políticas voltadas às comunidades tradicionais.

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